terça-feira, 31 de maio de 2011

Letra sem música

Ainda vou mexer muito nisso, coloquei aqui só pra não esquecer mesmo. É um rascunho do rascunho.


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Hoje é um dia de vento frio
Oh vento nos carregue para
uma estrela que gire
lentamente e amarelo.

Esse ar gelado que enche meu peito
sopre minhas esperanças.
Sopre-as até aquela janela
e faça da minha voz um sussurro.

A fumaça do chá fazendo círculos
e o aroma em cada gota de vapor.

Oh vento nos leve até uma estrela.

Distração, memória

Queria um poema sobre amor
Mas pensava em xícaras.

Em como gostava de seu café puro
com bolo de festa para adoçar.

No chá que - ele bem sabia -
ela tomava nas tardes de outono.

Nos cappuccinos divididos com os amigos.

Na sensação dos dedos gelados
tocando o copo quente de papel.

No banco da padaria lá de sua cidade.

Nos cafés com seu pai, na sua faculdade,
em casa, sozinho com a janela,
as árvores e o vento.

Sem perceber, escreveu um poema de amor pelas coisas.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Pai

Eu estava escovando os dentes para ir trabalhar. Uma tia telefona, minha mãe atende. Meu pai morreu. Minha mãe derrama algumas lágrimas, eu permaneço impassível.

Ainda estou, e sinto-me mal por não ter sentido nada além do espanto no momento da notícia.

Fui trabalhar - como sempre, estou escrevendo no metrô - e no caminho até a estação me lembrei dele, uma figura meio quixotesca, cavaleiro do ridículo que não conseguia domar seus próprios desejos; de riso fácil, sempre com uma piadinha pronta ou uma boa história para contar. Se vivêssemos juntos agora, seríamos grandes amigos.

Dos meus quase trinta anos, vivi dez com ele. Saímos de casa, começamos de novo e sem ele. Vi minha mãe sofrer muito para nos sustentar, enquanto eu vivia com minhas fantasias de criança e observava meus irmãos crescerem - melhor, engrandecerem-se. No começo de minha adolescência o via esporadicamente, e depois ele mudou de estado, indo morar com uma irmã.

Se eu tiver um filho, não quero que sinta o que senti ao saber da morte do pai: indiferença.

Hoje não quero pêsames, não quero nada, apenas que não falem comigo nem que exijam coisa alguma.

Essa distância, essa ausência, ajudou a me moldar. Não sou uma ave que foi ensinada a caçar, mas aprendi a escalar picos sozinho, e devo isso involuntariamente a meu pai, bem como inumeráveis exemplos, para o bem e para o mal.

E basta.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Caligrama I

Primeira brincadeira com os caligramas! Bem gostoso de fazer; imagino como o Apollinaire se divertia com isso. =3

manhã - 22/01/2011


Por que o fantástico, a escolha pela fantasia? A pergunta, simples, não tem como par uma resposta satisfatória.

Talvez eu ame o fantástico por não acreditar ou não me satisfazer com o que o real me traz, seja ele o cotidiano, seja a literatura. Posso assegurar que a literatura sobre o tédio burguês, que tanto ensinam nas faculdades, é pra mim tão enfadonha quanto um pão seco e um copo de café com leite, ou seja, tem lá sua utilidade, mas não me interessa de modo nenhum. Em contrapartida, a literatura do estranho exerce um fascínio sobre mim, proporcionando curiosos estados de alma, uma euforia misturada com estupefação. É algo difícil de explicar.

Percebi minha necessidade por ângulos diferentes e curiosidade pelo novo, embora esse novo geralmente não se coadune com as novidades práticas ou úteis de modo imediato, ao passo que teorias e visões particulares de mundo encantem-me - exceto as filosofias metafísicas que pressupõem estruturas rígidas e engessantes. Não as chamaria de falsas, pois julgo que "realidade" é um conceito aberto que depende muito do observador.

Novamente, por que o fantástico? Uma escolha, uma inclinação? Sei lá a resposta.



Imagens:
Emma Bovary, Charles Léandre.
Gilgamesh, Yoshitaka Amano.

Máximas mascaradas

E um monte de gente pensa assim.

"Não basta estar bem; você deve estar ótimo."

manhã - 16/09/2010

Fui lá comprar um presente. Escolhi uma caixa bem bonita, roxa com bolinhas brancas.

Aproveitei e fui até a seção de discos. Procurava algo que prestasse na parte de música brasileira, até que ouvi uma voz que soava entre o solícito e o mecânico: "A velha guarda fica aqui, logo embaixo do chorinho". Fui ao outro lado da prateleira e vi o vendedor se afastando, enquanto seu interlocutor se abaixava, um homem idoso mas de muito vigor, poucos cabelos e mãos inquietas que não passavam mais do que três segundos sobre cada caixinha.

- Essa Revivendo tem capas horríveis - tentei entabular uma conversa. A resposta foi um "é..." meio entediado, seguido de uma pergunta, semelhante a um teste para iniciados, respondida até que com certa facilidade.

A conversa seguiu e foi muito boa, embora curta. Não sei se lisonjeiros ou imprecisos, mas estimamos as idades, 20 e 65; erros grosseiros, tínhamos 29 e 79. Ele, fã de Dalva de Oliveira, faz aniversário dia 20 de setembro! Chegamos a cotejar algumas similitudes virginianas, ele com LPs, eu com livros.

Seu nome eu esqueci, mas tinha cara e jeito de Antônio, além do mesmo espanto que o meu, encontrar alguém com gosto musical semelhante.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Pessoas muito parecidas são como dois pássaros voando juntos: ao se tocarem, correm o risco de cair.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Pequenas mudanças

Mudei um pouco a descrição do blog.

Eu achava a anterior mais bonitinha e tudo o mais, mas um pouco pedante...
E troquei a foto também! A anterior era de 2006. De lá pra cá meu rosto mudou um pouco, o cabelo, as atitudes. Amadureci bastante ao longo desses anos, e pegando o que venho escrevendo, a diferença se nota.

Bom, vou deixar a antiga descrição aqui pra que fique registrada - e porque eu achei bonita, conforme já disse. ;)

"Aqui atualizo e exponho algumas das dúvidas, limitações e pequenas alegrias de meus dias, de modo titubeante e esparso, como cabe a um indeciso de mão cheia. É meu pequeno patíbulo onde mato as horas ainda não mortas, sepulto as ideias e vejo-as renascer sob outro signo."

Manhã de maio

Minha cabeça anda toda invencionada.
Pra todo o lado que olho,
que na verdade é o lado de dentro,
vejo a mesma coisa, escondida por mil cifras.
Embora eu desejasse explicar do modo simples,
as coisas só me vêm de jeito torto,
que é o jeito certo, já que galho não tem régua.

A melhor coisa a fazer é abrir a janela.
Sentir a lufada de ar rir no meio dos cachos,
a luz perene acariciar a pele
e a terra murmurar que está com sede.